01 Jan The (is)land of contemplation
São Jorge, Azores. The (is)land of contemplation.
Everything here has its own pace, its very own restrained inner rhythm. If someone tells you that you’re five minutes from reaching your goal, don’t believe it: multiply that number by another five. Time on this island just stands still.
Like the steep hills that always look down on you from one side, indelible giants, Jurassic looking, that give shape to the 246 m2 of the island.
Nature makes you self-contemplate while compelling you to contemplate what surrounds you.
Gazing at the ocean you can’t overlook Pico Island, with its great mountainous cone and slightly displaced tip. Your eyes just can’t ignore its bare flesh laying languidly on the horizon, like a nude model waiting for the painter’s final strokes.
You feel overpowered by an oppressive beauty, even on the island itself. At the top of the cliffs, looking down onto the fajãs, the peculiar geological formations that are unique to São Jorge, your heart pounds in vertigo and in misbelief: how is it that someone, centuries ago, decided to climb down the volcanic slopes and settle in these places that gave no certainties of being rolled away by the ocean’s waves? Life here was and, in a way, still is difficult. In an island that appears to have been drawn from the back of a dormant dragon, the answer for cultivating food laid in these tiny pieces of flat land by the sea, created by the collapsing scream of the neighbouring cliffs.
On these very hills, in Fajã dos Vimes, the only European coffee plantation grows in the backyards of the Nunes family home/ arts and crafts showroom/ local cafe. On its walls, dollar bills and reais talk of the faraway families that took a sip of this home-grown home-brewed coffee.
But not all fajãs are easy to reach. To get to Caldeira de Santo Cristo, the most celebrated fajã of the island, you have to walk. There are no cars going through. Only an occasional all-terrain vehicle disturbs the thick silence, leaving a burst of dust in our path. But, if you want to get to know the lagoon from where the only clams of the archipelago come from and if you want to dive in the ice-cold emerald colour of a promised waterfall, you do not hesitate.
Besides, when you return, at the end of the way there’s a perfect little worn place where you can regain your strength and enjoy the season’s most succulent clams, dipping in its rich stew of tomato and onions sauce, slices of bread. Pair that with the spiced matured island PDO (Protected Designation of Origin) cheese and pepper seasoned lupins beans and you have a very special contemplation of your own. Hunger talking? Not sure… After all, meals that come with great companions and reassuring flavours are among the best of the whole wide world.
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A ilha da contemplação
São Jorge, Açores. A ilha da contemplação.
Tudo aqui tem uma medida longa no tempo, um ritmo próprio, interno e refreado. Se alguém vos disser que em cinco minutos terão alcançado o vosso objetivo, não acreditem: multipliquem antes por mais cinco. O tempo, nesta ilha, petrificou.
Como as montanhas íngremes que sempre sobranceiam um dos nossos ombros, gigantes indeléveis e de aspeto Jurássico, que configuram uma ilha de apenas 246 m2.
A natureza compele-nos a contemplar o nosso eu mais íntimo com a mesma intensidade com que nos faz admirar aquilo que nos rodeia.
Olhando na direção do oceano, a ilha do Pico impõe-se-nos com o seu grande cone vulcânico e cume ligeiramente deslocado. Os nossos olhos não conseguem ignorar a sua carne desnuda, que se estende languidamente no horizonte, como um modelo nu que aguarda, com displicência, pelas últimas pinceladas do pintor.
Tudo exala uma beleza opressiva que impressiona. Mesmo no seio da própria ilha. Do topo dos penhascos, olhando para baixo, na direção das Fajãs, as peculiares formações geológicas que são únicas a São Jorge, o nosso coração palpita em vertigem e incredulidade: como é que alguém, séculos atrás, decidiu descer as encostas abruptas e assentar nestes lugares que mais parecem destinados a desaparecerem com as ondas do oceano? A vida aqui era e, de algum modo, ainda é difícil. Numa ilha que aparenta ter sido desenhada a partir do dorso de um dragão adormecido, a solução para o cultivo afigurou-se nestas pequenas planícies junto ao mar, resultantes dos gritos surdos que colapsaram os rochedos vizinhos.
Nestas mesmas colinas, na Fajã dos Vimes, a única plantação de café da Europa cresce nas traseiras da casa da família Nunes/ casa de artesanato/ café local. Nas suas paredes, notas de dólares e de reais falam-nos das famílias distantes que já beberam este café totalmente cultivado, tostado e moído em casa.
Mas nem todas as fajãs são fáceis de alcançar. Para chegar à Caldeira de Santo Cristo, a mais celebrada de todas as fajãs da ilha, é preciso andar. Os carros não circulam por aqui. Apenas uma ocasional moto quatro disturba a espessura do silêncio, deixando uma incómoda nuvem de pó no nosso caminho. Contudo, não há espaço para hesitações quando se quer muito conhecer a lagoa de onde provêm as únicas amêijoas do arquipélago e mergulhar numa prometida cascata de água cor de esmeralda-fria-como-o-gelo.
Além de que, no regresso, no final do caminho, existe um perfeito, pequeno e gasto lugar onde é possível retemperar forças e apreciar as amêijoas mais suculentas da estação, mergulhando no seu rico molho estufado de tomate e cebola, fatias de pão. Juntamos-lhes um picante queijo curado da ilha DOP (Denominação de Origem Protegida) e tremoços bem temperados com pimento e é bem possível que tenhamos uma contemplação muito só nossa. Será a fome a falar? Talvez sim, talvez não… Afinal, as aconchegantes refeições servidas em grande companhia estão entre as melhores de todo o grande e saboroso mundo.
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